“Infâncias” sempre são iguais...
“Um menino do grupo dizia que educação vinha do berço e eu
me sentia mal-educado. Ele andava devagar, arrastando os pés como se fatigado
pela falta do que fazer. Para curar a vida só com muito chá-de-pouco-caso,
lamentava pelo meio da casa. Cada quarto, cada sala, cada cômodo, uma página.
Ele subia em cadeira, trepava em escada, ajoelhava na mesa. Para cada notícia
escolhia um canto. Conversa mais indecente, ele escrevia bem no alto. Era
preciso ser grande para ler, ou aproveitar quando não tinha ninguém em casa.
Caso de visitas, ele anotava o dia, a hora, o assunto ou falta de assunto.
Enquanto ele escrevia, eu inventava histórias sobre cada pedaço da parede. A
casa do meu avô foi o meu primeiro livro. Leitura era coisa séria e escrever,
mais ainda. Escrever era não apagar nunca mais. O pior é que, depois de ler,
ninguém mias esquece se for coisa de interesse. Se não tem interesse, agente
perde ou joga fora. Comecei a reparar, e em minha família ninguém falava papai,
mamãe, vovó. Só podia ser por preguiça ou medo de carinho. Cada sílaba um
carinho, um capricho penetrando pelos olhos até o passado. Eu sabia os poderes
do pai, o silêncio do filho, sem conhecer o espírito santo. Fui feito para
pensar além do devido-falava eu- apertando os olhos para esquecer, apagar,
anular tudo. Depois, a palavra caía no meu ouvido e levava dias para doer.
Pensando devagar, acordado madrugada, eu descobria as tantas coisas sabidas,
mas não vistas e outras vistas e não sabidas. Doía muito se menino. E dor,
aumentada pelo silêncio, é como dente latejando com nervo exposto. Fé, esperança e caridade assistiam ''O direito de nascer'',
como única diversão. Usava caximir- buquê e perfumavam a cidade inteira, dizia
minha vó, sem inveja, por preferir alfazema, com rótulo de moça no campo e
cesta de flores no braço. ''Viver sem esperança é como ter casa sem janela'',
escreveu meu avô, com letra miúda, perto da fechadura. Ele não só Via com os
olhos.”
...pois não cabem ambições.
Grifei partes importantes de: POR PARTE DE PAI.
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